quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

EDITERNOS RIOS DE SANGUE

Sou um simples africano que quis saldar a sua dívida com o seu povo e viver a sua época. (Amílcar Lopes Cabral: 12/09/1924 – 20/01/1973)

Lisboa 1971
A Ovídio Martins e Osvaldo Osório

Em verdade Lisboa não estava ali para nos saudar.
Eis-nos enfim transidos e quase perdidos
no meio de guardas e aviões da Portela.
Em verdade éramos o gado mais pobre
d'África trazido àquele lugar
e como folhas varridas pela vassoura do vento
nossos paramentos de presunção e de casta.
E quando mais tarde surpreendemos o espanto
da mulher que vendia maçãs
e queria saber donde... ao que vínhamos
descobrimos o logro a circular no coração do Império.
Porém o desencanto, que desce ao peito
e trepa a montanha,
necessita da levedura que o tempo fornece.
E num caminhão, por entre caixotes e resquícios da véspera,
fomos seguindo nosso destino
naquela manhã friorenta e molhada por chuviscos d'inverno

(Arménio Vieira, In Vozes Poéticas da Lusofonia.edição: Câmara Municipal de Sintra. Organização: Instituto Camões. Coordenação: Alice Brás e Maia Armandina. Mem Martins, Maio 1999, p.2)

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